Ninguém pede pra nascer, é verdade. Mas a pior parte dessa etapa involuntária da vida é chegar ao mundo como consumidor. Além de uma fornecedora exemplar (a mãe), um bebê demanda por produtos e serviços desde a sua concepção. Alguns são até frutos da falha de pílulas, preservativos e outros métodos anticoncepcionais. Assim se descobre precocemente como é ruim ser cliente. A verdade é que, cedo ou tarde, todos nós vivenciamos essa frustrante experiência.
As minhas primeiras lembranças como cliente são de quando eu tinha mais ou menos dez anos de idade e estudava numa escola particular. Tudo era motivo de protesto. Parede suja, cadeira quebrada, professor sem conteúdo. Um pouco mais tarde, migrei para o ensino público. Lá, a passividade dos alunos quanto aos problemas do colégio era puro fruto do típico coronelismo presente nas pequenas cidades brasileiras, onde o cliente (cidadão) não tem voz.
Quando retornei à escola particular, o cenário mudou novamente. Qualquer coisa resultava em reclamação. E quase sempre éramos ouvidos, embora o tratamento não fosse o dos melhores... No primeiro período da faculdade, lá estava eu novamente, enviando um e-mail para o diretor do campus a fim de reivindicar um melhor atendimento por parte dos “profissionais” da secretaria. Resolveram meus problemas, mas ganhei a eterna antipatia de um setor inteiro.
Outra recordação ruim é a abertura da minha primeira bancária. Nem mesmo o primeiro salário de carteira assinada superou o trauma das horas e horas de filas, do mau humor dos funcionários e das inúmeras idas ao banco. De lá pra cá, já passei por outras três instituições. No fundo, são todas iguais. Com telefonia móvel é a mesma coisa. Acabei de transferir meu número para a terceira operadora, e a conclusão é a mesma: não há pra onde correr.
A lista de maus prestadores de serviço não para por aí. Plano de saúde, seguro residencial, eletricista, pedreiro, pintor, advogado, diarista. Tudo um lixo. Não há outra palavra para definir tamanho desprezo que nos é dado. Às vezes, a impressão é de que estão fazendo um favor. Nos setores públicos, o tratamento costuma ser ainda pior. São grossos, intolerantes, desinformados, arrogantes, debochados e esquecidos. Afinal, seus salários são pagos por nós, contribuintes.
O mau atendimento é como um vírus. Podemos ser contaminados em bares, restaurantes, sorveterias, supermercados, pousadas etc. Até em um SPA você corre o risco de se estressar. Lembram da velha – e nem tão boa – Ouvidoria? Já era. E as mídias digitais? Elas poderiam ajudar muito, mas ainda são usadas apenas para evitar barulho. As reclamações quase sempre param nos mesmos lugares. Por isso que os problemas quase nunca são solucionados. O jeito é ser o dono. Ou amigo dele!
O motivo de tamanho descaso é a falta de compromisso das empresas. No dia a dia, o cliente não é considerado nas decisões, embora nos discursos ele esteja sempre presente... A prioridade são os números. Investem em relacionamento com o cliente, mas não têm ideia do que é isso de verdade. Prometem tudo, mas não cumprem com o básico acordado. O pior é que para essa vida não há suicídio. Ser cliente é, definitivamente, padecer em um paraíso em chamas.
Boa reflexão, adorei o texto!
ResponderExcluirRealmente o cliente é muito importante na teoria, mas na prática o desprezo é evidente.
A maioria das empresas estão focadas nos lucros e não no atendimento e satisfação comprovada deste consumidor.
Acredito que estamos vivendo um eterno looping da desqualificação.
O consumidor não gosta do que compra, porém estão cada vez mais passivos aceitando o que é imposto por não querer "perder tempo" indignado, preferem pagar do que se estressar e desta forma as empresas se voltam para a concorrência, precificação e uma maior fatia do mercado.
Muito se fala na fidelização do consumidor, mas pelo que vejo essa fidelização só irá acontecer de fato quando a melhoria do processo for feita como um todo desde a produção do produto/qualidade do serviço até o ponto de Venda/atendimento.