terça-feira, 26 de junho de 2012

Um peixe fora d'água


Jean Dubuffet - 1948 - 91 x 73 cm
Sempre tive fama de polêmico, questionador e exagerado. Independentemente dos rótulos, confesso que está cada vez mais difícil ser eu. Propor diálogos, expressar um ponto de vista, repensar opiniões, mudar de ideia, equilibrar o otimismo com a desconfiança, reivindicar direitos e denunciar absurdos sempre foram atitudes comuns pra mim. Eis o problema: só pra mim. Tudo bem, eu não sou o único. A questão, na verdade, é a minha constante sensação de estar remando praticamente sozinho contra a maré.

Isso não tem nada a ver com perfeição ou heroísmo. Trata-se apenas da minha personalidade, que é composta por diferentes elementos – classificados por alguns como defeitos e qualidades. Também não é rebeldia, revolução ou vontade de romper com normas, regras, dogmas e teorias já estabelecidas. Este sou apenas eu, com toda a minha insignificância enquanto minúscula partícula de um imenso universo, tentando frustradamente tornar mais simples a complexa existência. Tentando, simplesmente, existir.

Acho que o problema está nas minhas pretensões. Eu já quis, por exemplo, ser uma pessoa só durante a vida inteira. Achava que isso era ser coerente. Mas, para a minha sorte, eu estava errado. Ainda que vivêssemos sempre no mesmo lugar, com as mesmas pessoas, sentindo os mesmos cheiros e vendo as mesmas coisas, passaríamos por transformações. Faz parte do jogo. Até porque ninguém está livre das ações do tempo e dos desdobramentos da vida.

Também já me chamaram de inquieto e inconformado (o que é verdade). Não que eu seja um eterno insatisfeito, mas o movimento é vital pra mim. Preciso sair do lugar, conhecer novos caminhos, falar com pessoas diferentes, trocas as cores da parede, aprontar algo novo sempre. Por outro lado, curto muito ficar em casa, repito rotas e atalhos, sou de poucos amigos, evito lugares cheios e faço questão de manter algumas manias. Parecem extremos, e podem até ser, mas tudo isso convive bem próximo aqui dentro de mim.

O fato é que eu me sinto um pouco estranho nesse mundão de meu Deus. Na infância, passava horas conversando com os avós dos meus amigos em vez de me concentrar nas partidas de futebol. Nos passeios da escola, deixava o grupo de conhecidos para andar com outras turmas. Uma vez, gostei de uma menina um pouco corcunda por enxergar beleza onde teoricamente não havia. Já fui parar dentro de uma favela por curiosidade, enquanto andava de ônibus pelo Rio, como um desorientado que se perde de sua família.

Mas quando refletir sobre eu mesmo se torna cansativo, olho para o entorno. Em vez de me prender ao que chama a atenção da multidão, me pego observando minuciosamente as pessoas e suas reações. Há quem diga que todo esse incômodo é "coisa de jornalista". Pois pra mim é mais uma tentativa. Dessa vez, de me enxergar no próximo para minimizar a angústia de se sentir um peixe fora d'água.

Um comentário:

  1. O movimento faz parte de nossa existência, queira a gente ou não. Pois já disse o velho filósofo: não se entra nunca no mesmo rio, porque nem você é o mesmo, nem o rio também será o mesmo (não sei citar exatamente a frase, mas o sentido é esse).

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